terça-feira, 10 de fevereiro de 2015

O GOLPE DA GRAVIDEZ NO IMPÉRIO.


            Eu sabia que o golpe da gravidez é prática safada de alguns anos para cá. Estava enganado. O lance sem-vergonha da mulherzinha que finge apaixonar-se por homem endinheirado é coisa muito antiga. A  fulana entrega-se a um astro (artista, desportista, político etc), engravida e, em seguida ao nascimento do bebê, aplica o golpe: cobra caríssimas pensões para os seus rebentos. Na verdade, o dinheiro não é bem para o custeio da educação do filho, embora parte dele seja para isso mesmo, mas para as próprias despesas do luxo no qual viverão a partir daí.
            Mas eis o registro mais antigo desse golpe criminoso; 1828. Conta-nos a História, com certas reservas, que D. Pedro I era useiro e vezeiro nas conquistas femininas. Isso todos nós sabemos. Que costumeiramente engravidava a esposa e, ao mesmo tempo, mulheres das mais diversas camadas sociais. Enquanto foi sexualmente ativo, D. Pedro I fez vinte e oito filhos, dez na própria esposa e dezoito em esposas dos outros e em impudentas raparigas da vida fácil. Soubemos que uma quituteira negra do Palácio de São Cristovão engravidou do Imperador e uma freira, na Ilha Terceira. Tirso de Molina, lá pelos idos de 1615 mais ou menos, criou o lendário Don Juan, personagem libertino escrito por inúmeros autores. Se fizéssemos um paralelo entre  Don Juan e D. Pedro I, este seria mais persuasivo galanteador.
            Mas reportar-me-ei ao caso mais estrepitoso do nosso Imperador. Em 1828, no Rio de Janeiro, a Rua do Ouvidor era a mais importante, pois lá havia muitas refinadas casas comerciais, na maioria de franceses. De passagem vindo de São Cristovão para o Paço da Cidade, D. Pedro I sempre transitava pela famosa rua em sua imponente carruagem imperial. Naquelas oportunidades, observava atentamente o animado comércio, com indisfarçável interesse nas modistas francesas ali estabelecidas.  conta-nos historiadores que o Imperador marcou presença amorosa com muitas dessas moçoilas.
            Magnífico observador do mulherio oriundo da França, D. Pedro I, num instante, pôs olhos na casa número 98, defronte à Rua Nova do Ouvidor. Naquele local, a empresa de Bernardo Wallenstein & Companhia, que cuidava de modas e papéis pintados. Evidentemente, ele não estava interessado nos produtos da empresa, mas na belíssima Dona Clemência Saisset, esposa do senhor Pierre Joseph Félix Saisset, sócio de Bernardo. Esta senhora, modista, tinha apenas vinte e cinco anos e  já mãe de dois filhos. Nas idas e vindas pelo local, D. Pedro I notou olhares sedutores da moça e, não teve dúvidas, planejou estratégico plano para levar ao sucesso a inevitável conquista. Contratou Pierre, marido de Dona Clemência, para colocar os papéis pintados nas paredes de todo o Paço de São Cristovão. Assim, enquanto Pierre ocupava-se com a tarefa contratada, D. Pedro I cuidava-lhe da esposa. Trabalho lá, traição cá.
            Certo dia, Pierre voltou para casa antes do horário habitual. Surpreso, encontrou o Imperador completamente nu em sua própria cama...
            - Tadinho, querido, ele tomou um violento tombo do seu cavalo e eu o trouxe para casa, tirei-lhe a roupa para aplicar-lhe massagem de socorro...
            Pierre fingiu acreditar. Imaginou as grandes vantagens lucrativas com a situação. Para começar, D. Pedro I autorizou-o a colocar faixa na fachada da sua empresa com os dizeres: "FORNECEDOR DA CASA IMPERIAL".
            "Olha o golpe aí, gente!" O previsível sempre acontece. Dona Clemência engravidou de D. Pedro I. Situação deveras constrangedora para o Imperador, que não encontrou outra solução para minimizar os efeitos do escândalo senão indenizar a peso de ouro Pierre. No dia 30 de dezembro de 1828, mandou o casal Saisset para a Europa. Dona Clemência recebeu vários presentes, um saque de setenta e cinco mil francos e um título de pensão vitalícia. O pequeno ser nascido do espúrio amor teria sua educação total paga com mesada régia. O menino nasceu em Paris, no dia 23 de agosto de 1829, batizado com o nome de Pedro Alcântara Brasileiro, registrados oficialmente como pai e mãe Pierre Saisset e Dona Clemência Saisset.
            Curiosamente a história ganharia proporções hilárias. O casal não escondeu a verdadeira paternidade do menino. O próprio Pierre bazofiava sobre o fato do rebento ser filho do imperador do Brasil. E para comprovar o que afirmavam, Dona Clemência divulgava na sociedade francesa toda a correspondência amorosa entre ela e D. Pedro I.
            Assim, deixo aqui um conselho aos rapazes endinheirados que se julgam irresistíveis: o golpe da gravidez é implacável. Cuidem-se!

Roberto Villani




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