Eu
sabia que o golpe da gravidez é prática safada de alguns anos para cá. Estava
enganado. O lance sem-vergonha da mulherzinha que finge apaixonar-se por homem
endinheirado é coisa muito antiga. A
fulana entrega-se a um astro (artista, desportista, político etc),
engravida e, em seguida ao nascimento do bebê, aplica o golpe: cobra caríssimas
pensões para os seus rebentos. Na verdade, o dinheiro não é bem para o custeio
da educação do filho, embora parte dele seja para isso mesmo, mas para as
próprias despesas do luxo no qual viverão a partir daí.
Mas
eis o registro mais antigo desse golpe criminoso; 1828. Conta-nos a História, com
certas reservas, que D. Pedro I era useiro e vezeiro nas conquistas femininas.
Isso todos nós sabemos. Que costumeiramente engravidava a esposa e, ao mesmo
tempo, mulheres das mais diversas camadas sociais. Enquanto foi sexualmente
ativo, D. Pedro I fez vinte e oito filhos, dez na própria esposa e dezoito em
esposas dos outros e em impudentas raparigas da vida fácil. Soubemos que uma
quituteira negra do Palácio de São Cristovão engravidou do Imperador e uma
freira, na Ilha Terceira. Tirso de Molina, lá pelos idos de 1615 mais ou menos,
criou o lendário Don Juan, personagem libertino escrito por inúmeros autores.
Se fizéssemos um paralelo entre Don Juan
e D. Pedro I, este seria mais persuasivo galanteador.
Mas
reportar-me-ei ao caso mais estrepitoso do nosso Imperador. Em 1828, no Rio de
Janeiro, a Rua do Ouvidor era a mais importante, pois lá havia muitas refinadas
casas comerciais, na maioria de franceses. De passagem vindo de São Cristovão
para o Paço da Cidade, D. Pedro I sempre transitava pela famosa rua em sua
imponente carruagem imperial. Naquelas oportunidades, observava atentamente o
animado comércio, com indisfarçável interesse nas modistas francesas ali
estabelecidas. conta-nos historiadores
que o Imperador marcou presença amorosa com muitas dessas moçoilas.
Magnífico
observador do mulherio oriundo da França, D. Pedro I, num instante, pôs olhos
na casa número 98, defronte à Rua Nova do Ouvidor. Naquele local, a empresa de
Bernardo Wallenstein & Companhia, que cuidava de modas e papéis pintados.
Evidentemente, ele não estava interessado nos produtos da empresa, mas na
belíssima Dona Clemência Saisset, esposa do senhor Pierre Joseph Félix Saisset,
sócio de Bernardo. Esta senhora, modista, tinha apenas vinte e cinco anos
e já mãe de dois filhos. Nas idas e
vindas pelo local, D. Pedro I notou olhares sedutores da moça e, não teve
dúvidas, planejou estratégico plano para levar ao sucesso a inevitável
conquista. Contratou Pierre, marido de Dona Clemência, para colocar os papéis
pintados nas paredes de todo o Paço de São Cristovão. Assim, enquanto Pierre
ocupava-se com a tarefa contratada, D. Pedro I cuidava-lhe da esposa. Trabalho
lá, traição cá.
Certo
dia, Pierre voltou para casa antes do horário habitual. Surpreso, encontrou o
Imperador completamente nu em sua própria cama...
-
Tadinho, querido, ele tomou um violento tombo do seu cavalo e eu o trouxe para
casa, tirei-lhe a roupa para aplicar-lhe massagem de socorro...
Pierre
fingiu acreditar. Imaginou as grandes vantagens lucrativas com a situação. Para
começar, D. Pedro I autorizou-o a colocar faixa na fachada da sua empresa com
os dizeres: "FORNECEDOR DA CASA IMPERIAL".
"Olha
o golpe aí, gente!" O previsível sempre acontece. Dona Clemência
engravidou de D. Pedro I. Situação deveras constrangedora para o Imperador, que
não encontrou outra solução para minimizar os efeitos do escândalo senão
indenizar a peso de ouro Pierre. No dia 30 de dezembro de 1828, mandou o casal
Saisset para a Europa. Dona Clemência recebeu vários presentes, um saque de
setenta e cinco mil francos e um título de pensão vitalícia. O pequeno ser
nascido do espúrio amor teria sua educação total paga com mesada régia. O
menino nasceu em Paris, no dia 23 de agosto de 1829, batizado com o nome de
Pedro Alcântara Brasileiro, registrados oficialmente como pai e mãe Pierre
Saisset e Dona Clemência Saisset.
Curiosamente
a história ganharia proporções hilárias. O casal não escondeu a verdadeira
paternidade do menino. O próprio Pierre bazofiava sobre o fato do rebento ser
filho do imperador do Brasil. E para comprovar o que afirmavam, Dona Clemência
divulgava na sociedade francesa toda a correspondência amorosa entre ela e D.
Pedro I.
Assim,
deixo aqui um conselho aos rapazes endinheirados que se julgam irresistíveis: o
golpe da gravidez é implacável. Cuidem-se!
Roberto Villani